Magnífico
Essa deliciosa peça que o Exmo. Sr. Marquês de Cavalcanti acaba de pregar a alguns papalvos indígenas, merece bem um prêmio. O marquês merece ser promovido a duque.
Qualquer gajo bem falante que aí chega, vindo da Europa e da Civilização, enfeita-se logo com um título de conde, de marquês (até príncipes e princesas já temos tido, mais ou menos russas) e começa logo a embrulhar elegantemente o indígena que cai como um patinho. E é muitíssimo bem feito.
Esse Marquês de Cavalcanti (eu só escrevo Marquês com M grande, que é pra dar importância ao gajo e ao capítulo) usou de um “truc” curioso e galante, para enganar os tolos. Tinha ele para seu uso particular uma ‘mademoiselle’ com escritório de cartomancia à Avenida Central. Por meios indiretos, conseguia encaminhar para a graciosa cartomante os papalvos dinheirudos a que queria enganar. Antes, tinha o Sr. Marquês o especialíssimo cuidado de informar (particularmente) à Mademoiselle do passado, presente e futuro dos ditos camaradas – de modo que quando qualquer um deles, por mero acaso, chegava a ir consultar a elegante cartomante, ela lhe dizia cousas tão íntimas da sua vida passada, da sua vida presente, que o camarada tinha de acreditar por força no que ela ainda lhe dizia de sua vida futura.
E como anteriormente o finório do Marquês já tinha entabulado com esses dinheirudos amigos os seus “vantajosíssimos negócios”, Mademoiselle aludia vagamente, com o ar mais cândido deste mundo, sem uma previsão categórica e concisa (para não fazer desconfiar) que “eles de futuro iriam ser muito felizes, em um negócio que estavam fazendo com um titular muito rico...”
Percebe-se, heim?... Diabólico, heim?... Quem é que escapa de uma destas?... Se a mulherzinha havia adivinhado todo o passado, todo o presente – como duvidar de que ela não acertava também, adivinhando o futuro?...
Todos caíam... As notas de polícia dizem que o Marquês levava indiretamente para a Avenida as suas futuras vítimas, que ignoravam as suas relações com a cartomante...
Também, tinha graça que ele fosse confessar o “truc”...
É claro, meus amigos, que esse Marquês merece ser promovido a Duque.
Gazeta de Notícias, 22 de abril de 1917.