Boatos...
Francelino Petalógico era proprietário e redator-chefe de um órgão de grande circulação chamado O Boato. Jornal muito lido, com uma tiragem de seiscentos milhões de exemplares (não obstante dizerem que o Brasil é um país essencialmente... analfabeto) O Boato dá sempre dezesseis e dezoito edições por dia, no inverno, sendo que às vezes no verão chega ao máximo de 39 edições. Agora, com a guerra, e esta trepidação diária em que vivemos, como pintos em cima de uma chapa quente – o grande órgão O Boato começou a dar cousas sensacionais de cinco em cinco minutos. Às 7 horas da manhã (dantes O Boato era matutino) vinha a nota piramidolosa de que um corsário alemão tinha metido a pique 742 unidades inglesas no Mar de Espanha. Às 8 horas havia um carapetão maior com vítimas; às 11 o kaiser havia tomado quatro cidades inglesas e um rubinat autêntico para não ter uma indigestão real. Às duas da tarde (porque O Boato também era vespertino) havia uma edição aumentada, com títulos graúdos: grande batalha naval! A esquadra alemã encurralara 389 navios ingleses ao largo da Lagoa Rodrigo de Freitas.
Puramente sensacional. Às 4 e meia da tarde o general Hindenburg jogava o “pocker” com o rei dos belgas, em Londres; às 2 da manhã (O Boato era matutino, vespertino, noturnino e madrugadino) rebentava em Niterói uma estralada germanófila, chefiada pelo Cardeal Arcoverde... As edições esgotavam-se rapidamente, de meio em meio minuto, aos milhões, bilhões de exemplares, que os gazeteiros vendiam por eletricidade...
Ainda ontem O Boato descobriu uma que é de se lhe tirar o chapéu. Uma revolução autêntica, o estouro da boiada, com cadáveres correndo pela Avenida Central, 18 couraçados alemãs no Canal do Mangue, dois submarinos no lago dos cisnes do Campo de Santana, e mais outro dentro de um chope que um alemão fingia beber na “terrasse” da Casa Cintra, antiga Castelões. Situação negra! Cousas pretas. A Áustria fizera já desembarcar, secretamente, oito ou dez batalhões de artilharia que estavam guarnecendo os centros estratégicos das ruas das Marrecas, Núncio, Tobias Barreto, S. Jorge e adjacências.
Última Hora – O Boato dava sempre 13 e 14 “últimas horas” todos os dias. Dava mais do que um relógio. Tinha aparecido morto o cadáver de um alemão (suspeitado de alemão) que, depois de interrogado na Assistência, declarou que era inglês de Marrocos e que havia perdido ontem 2$500 no galo.
O Boato deve aparecer hoje tarjado de luto pela morte do Neves.
Gazeta de Notícias, 13 de maio de 1917.
Francelino Petalógico era proprietário e redator-chefe de um órgão de grande circulação chamado O Boato. Jornal muito lido, com uma tiragem de seiscentos milhões de exemplares (não obstante dizerem que o Brasil é um país essencialmente... analfabeto) O Boato dá sempre dezesseis e dezoito edições por dia, no inverno, sendo que às vezes no verão chega ao máximo de 39 edições. Agora, com a guerra, e esta trepidação diária em que vivemos, como pintos em cima de uma chapa quente – o grande órgão O Boato começou a dar cousas sensacionais de cinco em cinco minutos. Às 7 horas da manhã (dantes O Boato era matutino) vinha a nota piramidolosa de que um corsário alemão tinha metido a pique 742 unidades inglesas no Mar de Espanha. Às 8 horas havia um carapetão maior com vítimas; às 11 o kaiser havia tomado quatro cidades inglesas e um rubinat autêntico para não ter uma indigestão real. Às duas da tarde (porque O Boato também era vespertino) havia uma edição aumentada, com títulos graúdos: grande batalha naval! A esquadra alemã encurralara 389 navios ingleses ao largo da Lagoa Rodrigo de Freitas.
Puramente sensacional. Às 4 e meia da tarde o general Hindenburg jogava o “pocker” com o rei dos belgas, em Londres; às 2 da manhã (O Boato era matutino, vespertino, noturnino e madrugadino) rebentava em Niterói uma estralada germanófila, chefiada pelo Cardeal Arcoverde... As edições esgotavam-se rapidamente, de meio em meio minuto, aos milhões, bilhões de exemplares, que os gazeteiros vendiam por eletricidade...
Ainda ontem O Boato descobriu uma que é de se lhe tirar o chapéu. Uma revolução autêntica, o estouro da boiada, com cadáveres correndo pela Avenida Central, 18 couraçados alemãs no Canal do Mangue, dois submarinos no lago dos cisnes do Campo de Santana, e mais outro dentro de um chope que um alemão fingia beber na “terrasse” da Casa Cintra, antiga Castelões. Situação negra! Cousas pretas. A Áustria fizera já desembarcar, secretamente, oito ou dez batalhões de artilharia que estavam guarnecendo os centros estratégicos das ruas das Marrecas, Núncio, Tobias Barreto, S. Jorge e adjacências.
Última Hora – O Boato dava sempre 13 e 14 “últimas horas” todos os dias. Dava mais do que um relógio. Tinha aparecido morto o cadáver de um alemão (suspeitado de alemão) que, depois de interrogado na Assistência, declarou que era inglês de Marrocos e que havia perdido ontem 2$500 no galo.
O Boato deve aparecer hoje tarjado de luto pela morte do Neves.
Gazeta de Notícias, 13 de maio de 1917.
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