HUMORISMOS
Todo homem tem o seu fraco.
O do Sr. Souza é festejar o dia dos seus anos com um sarau circuncisfláutico, onde corre à ufa um bastardinho “recebido diretamente”.
Na véspera ele envia aos jornais, pelo correio, uma nota assim concebida: “Completa mais um ano de existência o Ilm. Sr. J. F. de Souza, conceituado comerciante da nossa praça e sócio interessado da importante firma Pires & C.
A S. S. apresentamos as nossas congratulações”.
O noticiarista reduz tudo isto à forma lacônica – faz hoje anos o Sr. Fulano de tal – sem a quarta parte de um adjetivo amável, o que mete muita raiva ao Souza e fá-lo blaterar contra os jornais e dizer que nossa imprensa não se acha à altura da sua mixão xoxial.
A casa do anfitrião enche-se de gente, dança-se, brinca-se muito e mais de um casamento tem saído dali. O peru do Souza atrai gente de todos os pontos da cidade, porque ele conta amigos desde a Ponta do Caju até a Gávea.
Quanto ao belo sexo, há sempre lá um moçaime sacudido de encher o olho.
A data de aniversário do Sr. Souza é 22 de novembro.
Ora, neste dia, como sabem, houve na cidade pânico com a notícia de que a marinha se tinha revoltado contra a ditadura.
Os comensais costumeiros do Souza, todos burgueses pacatos e consertadores de tanque em dias de chinfrinada, não se atreveram a sair de noite para ir ao bródio.
Moças, porém, não faltaram, porque há certas raparigas que, em fazendo intenção de dançar, dançam mesmo, embora tenham de passar por entre um regimento de carabineiros ou por cima de uma floresta de baionetas.
A casa do Souza estava, pois, cheia de moças, umas trinta e tantas, mas só havia meia dúzia de rapazes dançáveis... tudo o mais era bogodó (bogodó é a alcunha que elas dão aos homens casados, que não namoram e só vão a reuniões para jogar solo, conversar sobre debêntures (que ódio têm elas dos debêntures!) e discutir política). O Souza estava furioso com a política, que lhe entornara o caldo. E punha as mãos na cabeça, cochichando com a esposa:
– Como há de ser, Sra. D. Eufrásia? Seis rapazes para 30 moças! E todas estão doidas por dançar!
– Já dançam umas com as outras... Isto é uma vergonha, seu Souza!...
O anfitrião, já tonto, sem saber como remediar a coisa, dirigiu-se a um grupo de rapazes e pediu-lhes pelo amor de Deus que saíssem a passeio pelo bairro e recrutassem moços seus conhecidos, a fim de o salvarem dos apuros.
Eles obtemperaram aos seus desejos, tomaram os chapéus e começaram o recrutamento. Mas, patuscos de força, apanharam o pião na unha e começaram a arrebanhar todos os rapazes que encontraram, fossem ou não seus conhecidos. A fórmula adotada era esta:
– Ó colega em anos, o senhor quer engrossar um firribidi?
Alguns recusaram-se, julgando ser troça, porém muitos outros foram vestir-se às pressas e aceitaram o convite.
Quem escreve estas linhas teve a honra de ser um dos recrutados.
Ah! não lhes conto nada!
Cem anos que viva, não encontrarei outra igual!
A habitação do Souza encheu-se subitamente de uma caterva de rapazes, positivamente resolvidos a divertirem-se.
D. Eufrásia, coitada! ao ver aquela invasão de desconhecidos, fugiu para o quarto e trancou-se por dentro.
As moças entusiasmaram-se e caíram numa pândega, que ninguém mais as podia conter.
Só viemos a saber quem era o dono da casa à hora da ceia.
Um sujeito de cavanhaque fez uma saúde às belas qualidades do Sr. Souza e da sua Exma. Senhora, a comadre Eufrásia.
Todos nós, de copo em punho:
– Sr. Souza!
– Sr. Souza!
– Sr. Souza!
– Sr. Souza!
– E a comadre, onde está? perguntou o homem do cavanhaque.
O Souza gritou para dentro:
– Eufrásia!
E baixo, a um filhinho:
– Vai chamar a mamãe... anda!
D. Eufrásia estava no quarto, embezerrada, vermelha, sem querer sair.
Ao lado duas senhoras procuravam convencê-la:
– Vá, titia, isto é feio...
– Os moço estão chamando vosmecê, dindinha...
Ela batia com o pé, que não ia, que não ia, que não ia!
– Ó Sra. D. Eufrásia, berra o Souza, cá se reclama a sua presença!
Por fim a matrona se apresenta, muito encalistrada.
– Comadre, às suas belas qualidades! disse o cavanhaque.
E todos nós, de copo em punho:
– D. Eufrásia!
– D. Eufrásia!
– D. Eufrásia!
– D. Eufrásia!
– Comadre!
..........................................................................................................................................................................................................................
O bastardinho recebido diretamente devia ter produzido o seu efeito, porque às 6 horas da manhã ainda se dançava, sem música, e no jardim da frente dois recrutados ressonavam ruidosamente, ressupinados na grama, tendo um deles a boca toda suja de fio d’ovos.
Parece que o Souza resolveu não fazer mais anos no dia 22 de novembro.
O Paiz, 13 de dezembro de 1891.
Todo homem tem o seu fraco.
O do Sr. Souza é festejar o dia dos seus anos com um sarau circuncisfláutico, onde corre à ufa um bastardinho “recebido diretamente”.
Na véspera ele envia aos jornais, pelo correio, uma nota assim concebida: “Completa mais um ano de existência o Ilm. Sr. J. F. de Souza, conceituado comerciante da nossa praça e sócio interessado da importante firma Pires & C.
A S. S. apresentamos as nossas congratulações”.
O noticiarista reduz tudo isto à forma lacônica – faz hoje anos o Sr. Fulano de tal – sem a quarta parte de um adjetivo amável, o que mete muita raiva ao Souza e fá-lo blaterar contra os jornais e dizer que nossa imprensa não se acha à altura da sua mixão xoxial.
A casa do anfitrião enche-se de gente, dança-se, brinca-se muito e mais de um casamento tem saído dali. O peru do Souza atrai gente de todos os pontos da cidade, porque ele conta amigos desde a Ponta do Caju até a Gávea.
Quanto ao belo sexo, há sempre lá um moçaime sacudido de encher o olho.
A data de aniversário do Sr. Souza é 22 de novembro.
Ora, neste dia, como sabem, houve na cidade pânico com a notícia de que a marinha se tinha revoltado contra a ditadura.
Os comensais costumeiros do Souza, todos burgueses pacatos e consertadores de tanque em dias de chinfrinada, não se atreveram a sair de noite para ir ao bródio.
Moças, porém, não faltaram, porque há certas raparigas que, em fazendo intenção de dançar, dançam mesmo, embora tenham de passar por entre um regimento de carabineiros ou por cima de uma floresta de baionetas.
A casa do Souza estava, pois, cheia de moças, umas trinta e tantas, mas só havia meia dúzia de rapazes dançáveis... tudo o mais era bogodó (bogodó é a alcunha que elas dão aos homens casados, que não namoram e só vão a reuniões para jogar solo, conversar sobre debêntures (que ódio têm elas dos debêntures!) e discutir política). O Souza estava furioso com a política, que lhe entornara o caldo. E punha as mãos na cabeça, cochichando com a esposa:
– Como há de ser, Sra. D. Eufrásia? Seis rapazes para 30 moças! E todas estão doidas por dançar!
– Já dançam umas com as outras... Isto é uma vergonha, seu Souza!...
O anfitrião, já tonto, sem saber como remediar a coisa, dirigiu-se a um grupo de rapazes e pediu-lhes pelo amor de Deus que saíssem a passeio pelo bairro e recrutassem moços seus conhecidos, a fim de o salvarem dos apuros.
Eles obtemperaram aos seus desejos, tomaram os chapéus e começaram o recrutamento. Mas, patuscos de força, apanharam o pião na unha e começaram a arrebanhar todos os rapazes que encontraram, fossem ou não seus conhecidos. A fórmula adotada era esta:
– Ó colega em anos, o senhor quer engrossar um firribidi?
Alguns recusaram-se, julgando ser troça, porém muitos outros foram vestir-se às pressas e aceitaram o convite.
Quem escreve estas linhas teve a honra de ser um dos recrutados.
Ah! não lhes conto nada!
Cem anos que viva, não encontrarei outra igual!
A habitação do Souza encheu-se subitamente de uma caterva de rapazes, positivamente resolvidos a divertirem-se.
D. Eufrásia, coitada! ao ver aquela invasão de desconhecidos, fugiu para o quarto e trancou-se por dentro.
As moças entusiasmaram-se e caíram numa pândega, que ninguém mais as podia conter.
Só viemos a saber quem era o dono da casa à hora da ceia.
Um sujeito de cavanhaque fez uma saúde às belas qualidades do Sr. Souza e da sua Exma. Senhora, a comadre Eufrásia.
Todos nós, de copo em punho:
– Sr. Souza!
– Sr. Souza!
– Sr. Souza!
– Sr. Souza!
– E a comadre, onde está? perguntou o homem do cavanhaque.
O Souza gritou para dentro:
– Eufrásia!
E baixo, a um filhinho:
– Vai chamar a mamãe... anda!
D. Eufrásia estava no quarto, embezerrada, vermelha, sem querer sair.
Ao lado duas senhoras procuravam convencê-la:
– Vá, titia, isto é feio...
– Os moço estão chamando vosmecê, dindinha...
Ela batia com o pé, que não ia, que não ia, que não ia!
– Ó Sra. D. Eufrásia, berra o Souza, cá se reclama a sua presença!
Por fim a matrona se apresenta, muito encalistrada.
– Comadre, às suas belas qualidades! disse o cavanhaque.
E todos nós, de copo em punho:
– D. Eufrásia!
– D. Eufrásia!
– D. Eufrásia!
– D. Eufrásia!
– Comadre!
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O bastardinho recebido diretamente devia ter produzido o seu efeito, porque às 6 horas da manhã ainda se dançava, sem música, e no jardim da frente dois recrutados ressonavam ruidosamente, ressupinados na grama, tendo um deles a boca toda suja de fio d’ovos.
Parece que o Souza resolveu não fazer mais anos no dia 22 de novembro.
O Paiz, 13 de dezembro de 1891.
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