quarta-feira, 2 de dezembro de 2015

J. Brito

Enganos...

Esse caso do “suicida” de Niterói tem o seu lado agradável.
Agradável – é bom dizer – para o “ressuscitado”, porque para o outro não teve graça nenhuma.
Aqui, um Sr. Nunes, que tinha uma agência de casamentos, partiu para o Ignorado. Partiu, deixando cartas, dizendo que ia para lá mesmo. E foi para Niterói. Lá, na Praia Grande, havia um homem com o lindo nome de João Antunes de Castro Guimarães (não é o Sr. João Guimarães) a quem aprouve espairecer, ir passear, dar um giro na zona, sem dizer nada à família... Por uma fatalidade dessas que descem d’além e caem em Niterói, apareceu lá um cadáver. Um homem havia dado um tiro nos miolos e estava no Necrotério. Quem era? A família (ou os parentes) do Sr. João Antunes de Castro Guimarães foi ao Necrotério e reconheceu o cadáver. Era o cadáver do defunto. Entrou logo em despesas e fez um enterro “baita”! Ao saimento fúnebre compareceram todos os “grossos” de Niterói, até o juiz de direito.
Entrementes, o Sr. João Antunes de Castro Guimarães (não é, etc.) estava em Maricá, a ler os jornais. E tanto leu que deparou com um anúncio de missa de sétimo dia. E tanto firmou, que viu o nome do falecido. E tanto viu o nome, que acabou vendo que a missa era dele, era por alma dele...
Ora essa!... E leu mais que o enterro havia sido muito concorrido, e que toda a gente em Niterói “churava”, como diz certa atriz do Recreio. O “defunto” disse consigo: “vão agourar o boi!” e tomou o trem à pressa a ver se chegava em Niterói a tempo de assistir à “sua” missa de sétimo dia...
Chegou a tempo... Os herdeiros ainda não haviam feito o inventário. Tudo estava intacto. Ah! que susto!... E o Sr. João Antunes de Castro Guimarães (não é o Sr. João Guimarães) saiu a correr, de jornal em jornal, de Niterói e de cá, a dizer que não tinha morrido...
Foi sorte!... Afinal, o outro, o que morreu de verdade, não deixou de ter o seu enterro pomposo. Sempre foi uma última consolação. O Sr. João Guimarães há de lamentar também – coitado! – que quando morrer de verdade talvez não tenha um enterro tão “baita” como teve agora... para os outros.


Gazeta de Notícias, 22 de outubro de 1916.

R. Manso

Gazeta de Notícias, 7 de setembro de 1911.


Tibúrcio da Anunciação era o personagem central das “Cartas de um matuto”, seção muito popular da revista Careta. A seção, iniciada por Viriato Correia, era então escrita por Mário Brant e Aristides Rabelo.

terça-feira, 1 de dezembro de 2015

J. Brito

Modernismos...

As palavras, como os vestidos, entram e saem da moda. Atualmente uma delas que grita é a palavra “palace”. Usa-se atualmente “palace” para tudo. Há anos, logo depois da crisma do antigo teatro Casino (que passou a ser Palace Theatre) a palavra estacionou um poucochito. Não estava em moda... De dois anos para cá, desembestou, celebrizou-se. Hoje tudo é “palace”. Já há três hotéis, quatro cafés, duas casas de bilhetes de loteria, uma de “tolerância” e uma de “bicho”, com o nome de “palace”. A epidemia é pior do que a que houve há tempos com o nome de “Rio Branco”. Um carteiro do Correio, que já tinha no seu livro de notas 12 ruas com o nome de Rio Branco, 13 leiterias, 17 bazares, 19 restaurantes, 12 casas de bicho, 11 vendas, enlouqueceu no dia em que lhe disseram que a travessa do Senado também passava a ser rua Rio Branco; e depois desse dia nunca mais as cartas chegaram a seu destino. Primeiro que se acerte a qual das doze ruas do Distrito Federal se destina uma carta que traga o nome de Rio Branco, o destinatário morre de velho.
Agora, a moda é com a palavra “Palace”. Nas proximidades do largo de S. Francisco há o “Palace Sorte” (casa de bicho), na rua do Hospício há o “Palace Paradis” (casa que não é de bicho), mas o cúmulo é uma senhora que anuncia nos jornais e assina-se “Palace Mariquinhas” – francamente é demais! Percebe-se que ela se chama Mariquinhas da Silva, Mariquinhas da Boa Vida ou Mariquinhas Quinhentos Réis. Mas a moda tem uma grande força sugestiva. Como talvez essa senhora tenha lido por toda a parte a palavra “Palace”, como “Palace” é a palavra que está na moda, entendeu ela que era “chic” pra burro pôr o “Palace” no nome. E nem ao menos assina “Mariquinhas Palace”; o “chic” é antepor ao nome a palavra fatal: Palace Theatre, Palace Hotel, Palace Café, Palace Mariquinhas. Francamente, não nos falta ver mais nada...


Gazeta de Notícias, 20 de outubro de 1916.